sexta-feira, 25 de setembro de 2009

Meu em mim Augusto dos Anjos!

Augusto dos Anjos

O saber das ciências empolgava o mundo na virada do Século XX. As pessoas antecipavam, num “frisson” do imaginário coletivo, o que viria a lhes acontecer no futuro. Consciências criadoras inspiradas no racionalismo científico que predominava, era a musa imaterial dos inúmeros escritores e artistas da época. A “belle époque” dava-se com todo seu esplendor diante da eminente realidade competitiva e impessoal que os novos tempos delineavam.

Augusto dos Anjos se destacou esmiuçando os mistérios do cosmo e da vida, o cataclísmico embate dessas forças transformadoras, que conspiram para a diluição do universo, onde se abriga um impiedoso Deus devorador das formas materiais, de quem nada lhe escapa ao glorioso ciclo de destruição. Tudo converge para a recomposição de novas formas, que mal se adapta, mal se conforta, se aplaca, e pouco a pouco se transforma: da dissimulada harmonia, surge a inquietante aflição melódica do universo “anjeliano” - que se repete na contínua ressonância das palavras, assim como na vida.

Trágico e fatalista, incontido na percepção do século que nos deixava, soube cantar as terminologias das ciências sem cair no conceitualismo cientificista que apenas alimentava a angústia metafísica humana. Afinadíssimo tenor das palavras, aspirava, no futuro incerto de um século que se acendia, os acordes do canto lírico da impotência humana diante da suprema força de um Deus onipotente e devorador da matéria, em eterna fusão inacabada.
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...e para não interrompê-lo:
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VOZES DA MORTE
Augusto dos Anjos

Agora sim! Vamos morrer, reunidos,
Tamarindo de minha desventura,
Tu, com o envelhecimento da nervura,
Eu, com o envelhecimento dos tecidos!
Ah! Esta noite é a noite dos Vencidos!
E a podridão, meu velho! E essa futura
Ultrafatalidade de ossatura,
A que nos acharemos reduzidos!
Não morrerão, porém, tuas sementes!
E assim, para o Futuro, em diferentes
Florestas, vales, selvas, glebas, trilhos,
Na multiplicidade dos teus ramos,
Pelo muito que em vida nos amamos,
Depois da morte, inda teremos filhos

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